quinta-feira, 22 de abril de 2010

Anexo Educação

A UNE em Chamas

A União Nacional dos Estudantes era toda festa no dia 30 de março de 64, quando inaugurava seu teatro na sede da praia do Flamengo, no Rio.

Na madrugada de 1 de abril, o prédio inteiro ardia em chamas, imprestável. E o país mergulhava nas trevas do golpe militar.

Tamanho ódio da extrema direita se explica em parte pelo sucesso do Centro Popular de Cultura, o CPC, orgão cultural da entidade.

É preciso produzir conscientização em massa, em escala industrial. Só assim é possível fazer frente ao poder econômico que produz alienação em massa.

No começo do CPC estavam Oduvaldo Vianna Filho (autor do pensamento acima), Leon Hirzman, Carlos Estevan Martins (seu primeiro diretor) e depois Carlos Diegues e Ferreira Gullar.

Dois textos básicos explicavam a proposta: A Questão da Cultura Popular (onde se define a "arte popular revolucionária"), de Carlos Estevam e A cultura posta em questão, de Ferreira Gullar.

O grupo encenou cerca de 20 peças teatrais, em cinema fez um filme e um documentário, e montou diversos shows de música popular.

Verbetes
Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha (acima), é um dos maiores teatrólogos de sua geração e do teatro brasileiro.
Morreu aos 38 anos de câncer e no leito ditou para a mãe os diálogos finais de Rasga Coração, um de seus maiores sucessos.
Foi considerado também um renovador da TV criando o programa
A Grande Família Sua trajetória é parecida com a de Gianfrancesco Guarnieri: Teatro Paulista de Estudantes (55) e Teatro de Arena. No Rio foi um dos fundadores do Centro Popular de Cultura, o CPC da UNE.

Ferreira Gullar, poeta e crítico de arte maranhense de S. Luís, onde nasceu a 10/9/30. Incansável na procura da sua verdadeira poesia e estilo. Em 54 lança Luta Corporal, ícone da poesia brasileira.
Participa do movimento concreto paulista e em 59 funda o neoconcretismo. Em 61 ocupa-se da cultura popular com Romances de Cordel. Morou por anos no exílio e voltou em 77.
"Minha poesia nasce do real e do comum das coisas banais, da luz suja e verdadeira que há nas coisas e nas pessoas", diz o poeta. Poema Sujo (76) é outro marco de sua obra. A Teoria do Não Objeto (59) é ensaio de leitura obrigatória.

Moral e Civismo Militar

A Junta Militar que assumiu após o afastamento de Costa e Silva por doença baixou o Decreto Lei 869 ordenando que a disciplina Educação Moral e Cívica fosse obrigatória no ensino do país em todos os graus.

O conteúdo da nova matéria escolar foi elaborado pela Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, com assessoria da TFP.

Teria oito finalidades

1. A defesa do princípio democrático, através da preservação do espírito religioso, da dignidade da pessoa humana e do amor à liberdade com responsabilidade, sob a inspiração de Deus

2. A preservação, o fortalecimento e a projeção dos valores espirituais e éticos da nacionalidade

3. O fortalecimento da unidade nacional e do sentimento de solidariedade humana

4. O culto à Pátria, aos seus símbolos, tradições, instituições, e os grandes vultos de sua história

5. O aprimoramento do caráter, com apoio na moral, na dedicação à família e à comunidade

6. A compreensão dos direitos e deveres dos brasileiros e o conhecimento da organização socio-política-e-econômica do País

7. O preparo do cidadão para o exercício das atividades cívicas, com fundamento na moral, no patriotismo e na ação construtiva visando ao bem comum

8. O culto da obediência à lei, da fidelidade ao trabalho e da integração na comunidade

A disciplina foi ministrada do curso primário ao superior e até na pós-graduação. No ensino superior a farsa levou o nome de Estudo dos Problemas Brasileiros.

Ou seja, era a fusão perfeita do pensamento reacionário, do catolicismo conservador e da Doutrina da Segurança Nacional da Escola Superior de Guerra.

Em 73, o ministro da Educação coronel Jarbas Passarinho homologou o Compêndio de Instrução Moral e Cívismo, de
Plínio Salgado, fundador da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP), e deu a pista da inspiração ao conteúdo...


MOBRAL

Movimento Brasileiro de Alfabetização

"Em 1960 surgiram as primeiras iniciativas de educação popular, voltadas também para a população adulta como o Movimento de Educação Popular, cuja proposta foi adotada por inúmeros países da América Latina e da África, e o Movimento de Educação de Base, iniciativa da CNBB.
A educação de adultos é uma questão fundamental para um país com altos índices de analfabetismo,
como é o caso do Brasil.
Discutida intensamente como uma questão de ação política pelo Movimento de Cultura Popular no início da década de 60(liderado pelo pedagogo pernambucano Paulo Freire), a nova metodologia foi maquiada pelo regime militar na década de 70 e ganhou dimensões igualmente gigantescas e alienantes no chamado Mobral, cujo grande feito foi ensinar os analfabetos a assinarem o próprio nome."
(Enciclopédia Encarta Microsoft, 1999)


Ensino Superior

Retalhado pelos gangster da educação


Era intensa a procura pelo ensino superior nos anos 60 e a administração militar encontrou a saída na privatização, já que decidira frear o investimento na escola pública e gratuita.

Abrir uma faculdade virou da noite para o dia um excelente negócio no início da década de 70 e deu espaço para verdadeiros gangsters do ensino explorarem esse "mercado".

A grande dificuldade era achar bons professores que se sujeitassem a trabalhar assim, nesse comércio de secos e molhados educacionais.

O Conselho Federal de Educação facilitava criminosamente a concessão de licença para funcionamento e credenciamento de cursos sem as mínimas condições.

Na cidade de S. Paulo encontramos alguns exemplos da distorsão verificada nesse campo. Um deles é a Faculdade São Marcos.

As antigas instalações de um seminário abandonado no distante bairro do Ipiranga abrigaram precariamente no início do negócio uma faculdade.

Com o grande lucro obtido e a proteção no período militar a "empresa" foi ampliando e diversificando os cursos oferecidos, incorporou imóveis vizinhos, construiu prédio e é hoje uma das universidades privadas paulistanas.

No Rio de Janeiro a Universidade Gama Filho tem história idêntica.

O governo militar recebia bem esse crescimento das escolas particulares pois ficava desobrigado de manter o ensino público e gratuito.

Com o subsídio oficial algumas "empresas" construíram autênticos campus verticais em prédios luxuosos. Quanto à qualidade do ensino... bem... sabe como é...faltam bons mestres e alunos com melhor nível...

As matrículas no ensino superior público eram de 75 por cento do total em 1964 e de 25 por cento dez anos depois com a multiplicação das faculdades particulares.

A conta desse descalabro com o ensino superior seria paga pelos "formandos". O mercado sabia muito bem da deficiência de um profissional formado nessas condições e dava preferência aos diplomas das faculdades e universidades tradicionais.

Conclusão - os jovens pagavam as caras mensalidades por cursos que não valeriam nada no futuro.


O Decreto Lei 477

- Era como estar numa cela na prisão. Só podia comer e dormir, e decorar o que o professor falou sem mudar nada, a gente devia praticar a autocensura 24 horas.

É assim a lembrança de um estudante, eu mesmo, o dono do blog, no tempo do 477.

O clima de apatia e desespero durou 10 anos na escola secundária e na universidade brasileiras. O decreto-lei 477 travou os caminhos de todo jovem que estudava então.

Tudo o que era normal o estudante fazer essa lei não deixava: desenvolver o senso crítico, reunião, troca de idéias, presença em manifestações públicas, não podia nada disso.

O estudo sério na sala de aula não interessava, só se podia repetir o que o professor falou, mesmo que fosse absurdo e injusto, ou não se passava de ano nem se tirava o diploma.

O 477 definia como crime na escola pública e particular "aliciar, incitar ou participar de movimento que tenha a finalidade de paralisar a atividade escolar, participar de passeatas, desfiles ou comícios não autorizados, imprimir, guardar, fazer ou distribuir material "subversivo" de qualquer natureza.

A pena para o estudante era de expulsão e proibição de matrícula em qualquer escola por três anos.

A punição com demissão também valia para funcionário, professor ou diretor, ficando impedidos de trabalhar em outra escola por cinco anos.

A apuração do "crime" era sumária e o acusado tinha 48 horas para defesa. Quem dirigia tudo era a DSi (Divisão de Segurança e Informação) do MEC, através de funcionário indicado pela escola.

Se o diretor do colégio ou reitor da universidade não concluísse a investigação 48 horas depois de recebida a denúncia, também era enquadrado nas penalidades do decreto, com demissão e proibição de lecionar se fosse professor.

Pela perfeição e requinte do mal, percebe-se o dedo do criador do AI 5 Gama e Silva na redação do 477.

Como ministro da Justiça de Costa e Silva, o professor Gama e Silva notabilizou-se por trazer sempre à mão o rascunho de um elenco de medidas de endurecimento da repressão política, o que acabou vingando em 13 de dezembro de 68 com a edição do Ato Institucional n 5.

( Costa e Silva disse ao general Olímpio Mourão Filho que quase teve ânsia de vômito ao ler a primeira versão do AI 5 de Gama e Silva, segundo o historiador Ronaldo Costa Couto)

A aberração do decreto 477 só foi revogada pelo Congresso em 79. Não se sabe quantos a "lei" alcançou. Para facilitar a aplicação, universidades introduziram as normas no próprio estatuto, como foi o caso da UNB.

Nenhum comentário:

Postar um comentário